Sobre sacolinhas, mochilas e super malas.

Olá, Coexpat! 
Tenho pensado muito em mala, talvez pelo meu eterno vai e vem...
O fato é que fazer mala virou uma atividade que exige tanta especialização que dá até medo. Eu sei, sou organizadora profissional, acabo com bagunça que até eu duvido, mas confesso - constrangida - que eu tenho medo de mala, principalmente das pequenas.
Sabe que eu procuro melhorar sempre...mas até hoje não sei se é melhor enrolar ou dobrar as roupas. Se é melhor espalhar os sapatos ou colocar nos cantos, se é melhor colocar as calças por baixo, ir recheando a mala e só depois pôr as pernas das calças por cima, também ainda não encontrei a melhor forma de levar as calcinhas.
Conheci uma menina que dizia que só levava as piores calcinhas nas viagens. A receita: ela ia usando e deixando pelo caminho. Já ouvi dizer que tem calcinha dela na Coreia do Norte. Como foi parar lá? Nem me atrevo!
Outro dia comprei uma mala de mão. Descobri que só a mala pesa quatro quilos. Sobraram 6 quilos para minhas coisas, caso ela vá comigo a bordo no avião. Eita mala mala.
O pior é que mala é como carro ou computador. Mal você compra a top de linha e já tem outra ultra mega mais fácil de levar...

É de dar inveja daquele povo que viaja o mundo com uma malinha empurrada pelo dedo indicador...
Eu desisti, assumo de peito aberto que, para mim, mala é um "ser" estranho de lidar.
Tanto que eu trabalhei em um lugar que tinha um concurso: o mala do ano. A premiação era sempre no dia da festa de confraternização da 'firrrma'. O mala, eleito pelos colegas, recebia faixa e tinha que dar volta olímpica pela empresa. Cena ridícula.
Ridículo foi um chefe que recortou um anuncio da Louis Vuitton e colou na testa: “eu sou mala, mas sou chique”, disse o eleito.

Confesso que tinha mala que era só uma sacolinha. Tinha aquele que era, na verdade, uma mochila, daquelas que parecem uma mala, mas não são, aliás, te ajudam...
Mas mala é uma coisa necessária não é mesmmm?
Então quando tenho que me relacionar com ela eu respiro fundo, me abasteço de paciência e encaro peça por peça, controlo o peso e faço o doloroso exercício da escolha: salto marrom ou mais claro? Camisa branca ou off white?
Tem situação mais desagradável? 

Claro que tem! Gente mala! Que fala e não tem rodinha, a não ser que esteja de patins...
ops...decisão mais recente da minha vida: cri-cri mode off. Afinal, somos o que somos, com ou sem mala por perto...
Então bora exercitar a leveza e a simplicidade ao arrumar a bagagem e bora agradecer à nossa malinha companheira de viagem, que carrega nossas coisas, nossos presentes, nossa saudade...  
Ah...eu juro que busquei links sobre o "melhor jeito de arrumar mala". Mas existe tanta informação na rede, que preferi deixar essa navegação pra você!
Vai viajar? Desejo um feliz relacionamento entre você e sua bagagem!!

Carmem Galbes

Tempo rei.

Olá, Coexpat!   
No começo da expatriação era um excesso de tempo!
Quanta fartura! Uma abundância de horas a meu bel-prazer que eu não tinha fazia tempo.
Mas o tempo foi passando, foi sendo direcionado, usado, requisitado.
E agora...
Parece que os dias têm tido horas a menos. 

Tudo tem passado muito rápido. 
Parece que tudo é de relance.
De repente eu acordo. 

De repente já estou no meio da manhã. 
De repente já é depois do almoço. 
De repente é fim de tarde. 
A noite baixou faz tempo. 
A madrugada já anuncia o dia seguinte e, sem que a digestão esteja completa, já é hora do café da manhã.
Tem um monte de recheio entre uma hora e outra. Mas tudo tem sido tão rápido, tão express

Não sei o que está acontecendo...
Não dá tempo de pensar, de sentir...
Não dá tempo de mastigar 20 vezes, sentir o gosto, engolir.
Não tem dado tempo.
Sem tempo falta inspiração. Falta cuidado com as palavras, gentileza com o texto, atenção com o raciocínio.
Quando não há tempo, a alma fica anêmica, o espírito desnutrido.
Sem tempo sobra vazio. E o vazio é ladrão do tempo.
Sei do tempo de plantar, de colher, de recolher, de sorrir...mas não sei desse tempo que se apequena, dessa greve do tempo...tempo de menos.
Que escassez! Que angústia...

Vou dar tempo ao...bom...melhor economizar.

Carmem Galbes

O choque que mata e faz viver!

Olá, Coexpat!
Muito interessante quando se tem acesso ao lado de lá do espelho. 

Estava lendo uma matéria, dessas de domingo, que conta a experiência de um expatriado alemão no Brasil, especificamente em São Paulo.
Interessante que as dúvidas, os receios - ou pavor, como preferir - os micos e as boas surpresas são comuns, independente da origem do expatriado.
Aí veio a fala de uma especialista que trabalha para tentar facilitar a vida do estrangeiro."O que tentamos fazer é dar todo o apoio psicológico para atenuar o choque cultural. O importante é que o estrangeiro se acostume com São Paulo o mais rápido possível, para poder render no trabalho.”
Que somos mais um número ou uma cifra, não é novidade nem aqui, nem lá longe. O interessante foi ouvir o termo “tentar diminuir o choque.”
Ótima informação: expatriação dá choque e ponto! Pode ser um baita choque ou só um tremelique, mas vai ter choque!

É normal assustar, é normal doer, é normal reagir meio que sem pensar.
Concordo que levar choque é chato pra caramba. Conheço gente que tem raiva de levar choque, fica com ódio até!

A reação é mesmo pessoal...
E as consequências desse choque vão variar de pessoa para pessoa, a partir das suas experiências, da sua resiliência, da sua resistência a dor, da sua capacidade de recuperação...
O choque da expatriação pode ferir com gravidade a alma...mas dizem que não mata! 

Ah...eu já acho que pode matar, sim!
Vou viajar agora, aperte os cintos...
Eu acho que o choque da expatriação (que pode ser cultural, de identidade e por aí vai) pode matar sonhos, pode matar relações, pode matar afeto, pode matar o prazer, pode matar a saúde, pode matar a disposição, pode matar a autoestima, pode matar a coragem, pode matar o senso de identidade, pode matar projetos em comum, pode matar valores, pode matar crenças, pode matar todo um modo de ver o mundo, pode matar todo um modelo de vida.
O bom é que esse choque mata, mas também tem carga para fazer viver. Não para ressuscitar, mas para gerar uma nova vida. E, pelo que tenho visto, essa nova vida geralmente vem super energizada! 
Quem renasce desse choque surge com mais poder, mais força! É algo difícil de colocar em palavras...o choque da expatriação transfere uma carga tão alta para a pessoa, que é como se ela se transformasse naqueles equipamentos que só precisam, de tempos em tempos, ficar um pouco expostos ao Sol para voltar a funcionar. É como se a pilha, a força para lidar com os acontecimentos da vida nunca mais acabasse.
Claro que o processo não é simples. Como já disse, choque fere, choque dói.
Mas os ferimentos podem ser tratados e cicatrizados. 
Melhor ainda: a saída não seria se preparar, usar luvas, uma toalha, chinelos de borracha para isolar um pouco corpo e alma
A descarga não seria evitada, mas reduzida... 
Por outro lado, se o choque pode trazer tanto poder, tanta energia, por que atenuá-lo?
Para evitar mortes desnecessárias!
Então é isso! Desejo conhecimento e discernimento para a exposição ao choque da expatriação e coragem, força e paciência para tirar o melhor dele.

Carmem Galbes

Sobre o diferente e a diferença.

Olá, Coexpat!
Às vezes gosto das entrelinhas. Principalmente daquelas que não são de propósito.
Hoje uma dessas, boba até, me devolveu a postura retinha em meio à uma aula sobre interpretação.
Um aluno árabe não conseguia entender o motivo de a professora não ter considerado como certa a resposta de um exercício. Para ele, Tula, personagem principal do filme 'O Casamento Grego', não estava sendo irônica ao falar sobre as valiosas lições que aprendia nas aulas de Grego. Não sei se você viu, a cena é aquela em que o professor diz que se Fulano tem um ouro e Cicrana tem nove, então logo poderão se casar.
Eu fiquei pensando no motivo dele não ter encontrado a ironia ali. Era uma cena fácil, simples. 

Mas...não para ele! Não para a realidade dele!
O assunto passou. O cara é inteligente e logo entendeu como a maioria percebia a cena. 

Mas fiquei com aquilo na cabeça. 
Quantas vezes a gente nem percebe que o mundo vai além da esquina, além da noção pessoal de situações e sentimentos? 
Quantas vezes magoamos, ferimos, humilhamos sem ao menos perceber? 
Quanto mal-entendido poderia ser evitado?
É estranho porque não tem relação com preconceito explícito ou subentendido. É mais grave. Está relacionado à falta de consciência mesmo em ralação ao outro e aos diferentes modos de vida, crenças e valores.
Lembrei de outro “causo”, o da professora paquistanesa que ficava irritada com o fato dos americanos nunca saberem onde estão as informações básicas de um passaporte. Ela só ficou mais calma depois de entender como era difícil para o americano médio conhecer um passaporte. Afinal, geralmente tem passaporte só quem sai do país, ?
O novelo foi diminuindo até eu resgatar
Anais Nin. A francesa de nascimento e americana por decisão, resumiu esse meu dia assim: "não vemos as coisas como elas são, mas como nós somos."
Acho que ter isso em mente traz um grande alívio...mas também uma grande responsabilidade!


Carmem Galbes

Andança.

Olá, Coexpat!
Nas últimas semanas, tenho me dedicado a sondar as características que fazem de nós seres humanos.
Falar, pensar, lembrar... E, no rastro das inúmeras histórias levantadas pelo Ike, mais uma qualidade humanóide: a maldade.
O “causo” que ouvi: fila imensa no posto de gasolina. Uma senhora, que chamarei de "Eita", enche o tanque. Em vez de estacionar o carro e assim liberar a bomba antes de pagar, não move o veículo. A história seria basicamente de pura falta de noção do outro não fosse um detalhe. Uma pessoa reclamou. Aí a maldade entrou em cena. A reação: “só porque você reclamou, vai esperar mais cinco minutos. Não estou com pressa.” E dona "Eita" ficou dentro do carro emperrando a fila, pode?
A questão é, a maldade, por ser uma construção cultural, pode variar de acordo com a geografia?
Pelo exemplo da motorista, não. Talvez mude o requinte, o grau, mas o objetivo: ferir o outro, independente do jeito e trejeito, permanece.
Então, se o pior do ser humano resiste às fronteiras, por que tanta andança por aí? Resposta que ouvi: porque outra coisa que faz de nós humanos é a idéia de futuro e a esperança! 

Só por isso vou seguir viajando...e mudando...só por isso...só por hoje...

Carmem Galbes


Paciência.

Olá, Coexpat!
Muita gente ainda continua sem luz aqui em Houston, quase metade da cidade. 

Na tv, as imagens ainda são de gente nas filas à espera de gelo e água potável. 
Os alojamentos seguem lotados e as escolas fechadas. 
Um dos maiores shoppings da região, com as grifes mais badaladas, está fechando quatro horas mais cedo. Acontecer isso em um país pautado pelo consumo é porque a coisa foi feia mesmo.
O Ike matou 27 pessoas no Texas. 
O governo do estado já assinou contratos no valor de US$ 150 milhões para recuperação da região.
Aos poucos a vida para a outra parte dos moradores da cidade vai voltando ao normal. 

Os dias têm sido de limpeza. Árvores aparadas, fiação levantada, mercados reabastecidos e reabastecendo, restaurantes abertos. O período do toque de recolher foi reduzido de nove para seis horas.
Os museus estão reabrindo, mas os teatros, outra marca registrada de Houston, ainda estão apagados. É que estão localizados em uma das regiões mais judiadas pelo Ike, o centro.
Resta saber quando o ânimo e a coragem do pessoal será restaurada.

Os moradores de Galveston, no litoral do Texas, ainda não podem voltar para ilha. A devastação por lá foi total e ainda tem gente sendo resgatada.
Confome a água e a poeira vão baixando, o lixo vai aparecendo. O Xerife da cidade está tendo que explicar porque, apesar da ordem de evacuação, não permitiu que 1000 presos fossem retirados da cadeia de Galveston. A resposta, o prédio foi construído para aguentar um furacão categoria 5, o Ike foi 2, e agora, diz o homem, essas pessoas estão em situação melhor que a dos "moradores de bem". Então tá.
Enfim hoje é sexta-feira de verdade. Mas uma sexta diferente. A cidade está em outro ritmo. O trânsito está complicado, com muitos semáforos ainda piscando no amarelo. O interessante é como o povo se organiza. Uma turma por vez em cada canto do cruzamento. Não tem buzina. Só muita paciência.
Paciência é a senha mesmo. Para tudo. Paciência com a gente, com os outros, com a vida. 

Paciência...

Foto de LM Otero: AP

Carmem Galbes

Meu relógio pirou!

Olá, Coexpat!
Não sei se já aconteceu com você...

Desde sexta passada parece que vivo em um loooongo dia.
Parece que desde sexta é sexta. 
Interessante é que alguns aspectos da rotina básica seguem intactos. Tenho dormindo durante a noite, feito as refeições nos horários tradicionais etc e tals.
Mas parece que estou meio fora do grande relógio da vida. É como se você perguntasse que horas são e respondessem: agora. 

Sim a hora é agora, mas não faz sentido a resposta.
Até ontem não sabia ao certo que dia era do mês, nem da semana, mesmo porque na minha cabeça estava decidido que era sexta.
Fiquei pensando se essa confusão com o calendário estaria relacionada à pane no sistema de energia. Se for isso, estou mesmo lascada. Teria eu decidido que os dias são ditados pela tecnologia, pela informação, pelos compromissos, não pelo Sol que nasce e se põe? Haja desconexão entre mim e a natureza...
Para ajudar nessa aflição, recebi de longe um convite vencido para um ciclo de palestras. Tema: o que é humano hoje?
Na preguiça respondo: é o ser que fala.
Mas depois desse furacão, dessa confusão no meu relógio sóciobiológico, dessa coisa de não conseguir direito dar nome ao que se passa, ao que se sente, fico pensando que a resposta já não é tão simples assim faz tempo.
Pensando bem, não bastam os furacões que a gente cria na nossa vida. Às vezes é preciso um furacão de verdade mesmo para levantar a poeira, sacudir as certezas e exigir uma reconstrução. 

Aliás, o que é certo? O que é verdade? O que vale a pena?
Ihh... esse Ike...


Carmem Galbes

Expatriação e divórcio.

Olá, Coexpa t ! Eu poderia começar esse texto com números sobre a taxa de separação entre os casais que embarcam em uma expatriação. Númer...